segunda-feira, 19 de julho de 2010

As Raízes Missioneiras nas Periferias Urbanas de Canoas

As raízes missioneiras (dos Índios Guarani) nas periferias urbanas foi tema de oficina no Fórum Social Mundial 2010 em Canoas, onde se pretende construir um monumento de Sepé Tiarajú.

Na celebração dos 10 anos do Fórum Social Mundial, entre tantas coisas lindas e importantes, aconteceu uma oficina sobre as raízes missioneiras. A oficina reuniu o interesse e a presença comprometida de inúmeros lutadores sociais do povo com a sabedoria literária e prática sobre os Índios Guarani e as periferias urbanas do Irmão Antônio Cechin com a alma missioneira do músico Pedro Ortaça e o compromisso político do Senador Paim e do Vereador Ivo Fiorotti.
Também estiveram presentes os familiares do músico Pedro Ortaça, representantes da Via Campesina e inúmeras lideranças comunitárias e autoridades da região. O Prefeito Jairo Jorge, que havia agendado para participar, não podendo chegar a tempo, enviou sua assessoria para representá-lo. E o Deputado Marco Maia, vice-presidente da Câmara Federal, que é autor da lei que reconhece Sepé Tiarajú como Herói da Pátria, manifestou o desejo de comparecer, mas por causa de outros compromissos não pode estar presente.
A oficina sobre as raízes missioneiras nas periferias urbanas ocorreu no dia 27 de janeiro, no Parque Eduardo Gomes, com o objetivo de refletir o tema e assumir o compromisso de despertar as raízes históricas nos índio-descendentes Guarani nas periferias urbanas como elemento de mobilização e organização.
Nem todos os riograndenses sabem, mas o evento fundante do Povo Gaúcho, do Estado do Rio Grande do Sul, não está na presença dos portugueses e espanhóis e sim na experiência cristã socialista, de vida comunitária e de autentico espírito republicano nas Missões Jesuíticas Guarani. No território que hoje se compreende o Estado do Rio Grande do Sul, haviam sete povos perfeitamente organizados numa exemplar vida coletiva, sendo um deles, o povo de São Miguel, que era a capital, na época equivalente ao município de São Paulo.
Porém, um acordo entre as coroas de Espanha e Portugal, o chamado Tratado de Madrid, pretendia, de forma prepotente e autoritária, reordenar os povos e as demarcações de terra. Descontentes com o tal tratado e cientes de que isso representaria o declínio de suas comunidades, os Índios Guarani resistiram o quanto puderam. Entre eles havia o líder Sepé Tiarajú, hoje reconhecido como santo popular e oficialmente como Herói Riograndense e Herói da Pátria. Sepé liderou seu povo na luta até último suspiro guarani, mas tombou em combate numa emboscada, juntamente com inúmeros outros combatentes.
Com a morte de Sepé, em 7 de fevereiro de 1756, há 254 anos, os Guarani que sobreviveram acabaram se espalhando e muitos passaram a conviver com outros pobres descentes portugueses e espanhóis e foi acontecendo o fenômeno da miscigenação. Por isso, hoje, muitas famílias tidas como descendência espanhola e/ou portuguesa, são na verdade também descendentes dos Guarani das Missões Jesuíticas dos Sete Povos. E estes são os pobres que sobreviveram às margens da sociedade gaúcha. Os índios Guarani, outros povos indígenas e outros gaúchos mestiços, assim como afrodescendentes, foram os filhos deserdados, os que não herdaram terras neste Estado.
Sendo vítimas do latifúndio, os descendentes Guarani foram migrando para as periferias urbanas. No entanto, não deixou de correr nas veias o sangue indígena Guarani. E estas raízes históricas, chamadas “Raízes Missioneiras”, dos índio-descendentes Guarani, com certeza influenciaram na vida social, na organização comunitária, na participação popular e na resistência dos pobres nas periferias urbanas, como é o caso das ocupações de terra na cidade de Canoas/RS. O que também se pode dizer de toda a região metropolitana de Porto Alegre, onde se desenvolveram muitos processos de organização e participação popular.
Hoje é de fundamental importância despertar as raízes históricas nos índio-descendentes Guarani que vivem nas periferias urbanas, como elemento de mobilização e organização. Já na década de 70, o Irmão Marista, Antônio Cechin, teve esta intuição e promoveu a Romaria da Terra, que teve sua primeira edição justamente no lugar onde Sepé Tiarajú foi morto em combate, no município de São Gabriel. A Romaria da Terra surgiu como uma ferramenta mística para embalar o povo na luta. Aí vieram as ocupações de terra, as CEB’s, o MST, a CPT e toda uma caminhada de organização e luta embalada pela mística de Sepé Tiarajú e os Índios Guarani.
Este resgate das raízes missioneira não foi uma coisa imposta, mas um despertar de algo que já estava presente no sangue dos índio-descendentes Guarani, sobreviventes nas periferias urbanas. Estas raízes históricas não podem ser sufocadas. Elas devem ser resgatadas para garantir a vida e a dignidade humana. É importante também frisar a dimensão ecológica na cultura Guarani e indígena, de um modo geral. Mais do que recordar em momentos de debate e reflexão, é preciso despertar no cotidiano a herança guaranítica nas comunidades como elemento de mobilização e organização popular.
Em nível de organização dos movimentos sociais, Irmão Antônio Cechin foi um dos pioneiros no resgate das raízes missioneiras. Por isso, Irmão Antônio foi um dos convidados para refletir esta temática juntamente com o músico missioneiro, o Índio Guarani Pedro Ortaça. E, aproveitando a presença do Irmão Cechin, também foi realizado o lançamento do livro “Empoderamento popular, uma pedagogia da libertação”. Publicado pela editora ESTEF, com a colaboração do Instituto Cultural Padre Josimo. E para o lançamento do livro, este presente o teólogo Luiz Carlos Susin, do Fórum Mundial de Teologia da Libertação, que também fez parte do Comitê Ano Sepé Tiarajú em 2006. O livro traz uma coletânea de artigos, palestras, escritos de Irmão Cechin que refletem uma caminhada dos últimos 50 anos, demonstrando o empoderamento do povo que venho se organizando através de uma pedagogia libertadora. Esta obra vem para coroar uma trilogia de publicações ocasionada pela celebração de oitenta anos de vida de Ir. Antônio Cechin.
A partir das reflexões e debates foram assumidos alguns compromissos concretos no sentido de resgatar as raízes missioneiras, despertar essas raízes históricas nos índio-descendentes das periferias urbanas como elemento de mobilização e organização. E também, com a presença de teólogos, religiosos e músicos missineiros e liturgos, foi possível assumir o desafio de criar uma Missa Missioneira.
O Senador Paim garantiu lutar por uma emenda no orçamento da União, que favoreça a vida dos Índios Guarani e a concretização de um antigo sonho de se ter em Canoas um monumento em homenagem a Sepé Tiarajú. O monumento não será apenas para venerar um herói, mas resgatar toda a história e que a imagem de Sepé representa para o Rio Grande do Sul. Para continuar o caminho assinalado pela oficina do FSM foi planejado criar em Canoas o Comitê Sepé Tiarajú.

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